A HIPOCRISIA DA COPA

Investimentos em Guadalajara para os Jogos Pan-Ameicanos não serão altos e atenderão demanda o evento. Sistema de cartões eletrônicos deve servir de legado para a cidade mexicana
ADAMO BAZANI – CBN
Ao abrir os jornais ou sites de notícia ou especializados e ver a quantidade de dinheiro que o Brasil deve utilizar em mobilidade urbana com projetos mais voltados para a Copa do Mundo que para o cidadão, é de assustar e revoltar pelo volume de recursos que deve ser investido e também pela busca de ganho de imagem em modais e obras que vão custar muito mais caro que diversas soluções já conhecidas, que atendem ao mesmo número de pessoas, porém que dão menos notoriedade, Ibope.
São R$ 12,1 bilhões investidos nas cidades-sede da Copa.
Boa parte destas intervenções nos transportes pode virar legado para população. Outras, mesmo sendo caras, como alguns monotrilhos e VLTs, terão menos serventia depois de cada seleção mundial seguir seu rumo.
Será que para transportar torcedores para a Copa precisa mesmo de tanto dinheiro.
Guardadas as devidas proporções, mas com o mesmo objetivo, Guadalajara, no México, para sediar os jogos Pan-Americanos adotou uma medida simples, que deixa a cidade bonita e que vai consumir poucos recursos pois será apenas mesmo para atender à demanda do evento esportivo.
A solução todos conhecem: o ônibus. Mas com um detalhe. Foram estudadas as rotas que serão mais usadas pelos torcedores, delegações, imprensa e demais envolvidos nos jogos e nas vias mais largas já têm sido pintadas faixas coloridas, com o símbolo dos jogos Pan-Americanos, por onde devem circular exclusivamente os ônibus.
A medida será adotada agora no início de outubro.
Com cartões eletrônicos de identificação, a título de testes, voluntários e integrantes da força-tarefa de organização do evento, vão se deslocar gratuitamente pelas faixas.
INVESTIMENTO SEM HIPOCRISIA:
A medida de Guadalajara tem uma diferença em relação a algumas obras brasileiras voltadas para a Copa. Ela não é hipócrita.
A ação de Guadalajara não é para a mobilidade urbana de toda a população. É declaradamente pontual para os jogos Pan-Americanos, em compensação não vai gastar demasiados recursos como no Brasil.
No Brasil, em nome do deslocamento da população, têm sido elaborados projetos que visam mesmo a Copa e são caros demais.
Não seria mais justo gastar menos o que é só para a Copa, uma demanda muito limitada frente ao dia a dia das necessidades dos municípios, e aí sim, investir pesado em meios de transportes e projetos sérios em itinerários que realmente são usados pelos cidadãos?
Afinal, qual a utilidade de um monotrilho, por exemplo, que sai de um aeroporto e para num estádio? Tanta utilidade que, no caso do Monotrilho que sairia do Aeroporto de Congonhas e iria até o estádio do Morumbi, ele caiu para segundo plano depois de a Fifa ter rejeitado o estádio de São Paulo.
De duas, uma: Ou os investimentos são pensados só para a Copa e como o Morumbi não será mais sede de jogos, o monotrilho perde importância ou então, de fato, haveria outras ligações com muito mais necessidade que a desta obra que vai consumir, pelo menos R$ 3 bilhões. O monotrilho é caro frente ao benefício e número de passageiros que ele vai atender se comparado com um corredor de ônibus moderno e rápido, como os BRTs (Bus Rapid Transit), ou com um metrô de verdade.
Para os torcedores e visitantes dos jogos de Guadalajara, a passagem de ônibus, por bilhete eletrônico custará 6 pesos (menos de R$ 1). A LÓGICA É SIMPLES: TRANSPORTE DE IMPLANTAÇÃO E OPERAÇÃO BARATAS, TARIFAS BAIXAS TAMBÉM.
Os ônibus para os torcedores vão operar das 06 h às 23 h.
E mesmo sendo uma ação não hipócrita só para o evento esportivo, ainda sim pode deixar um legado para a mobilidade de verdade dos cidadãos.
Em Guadalajara não há bilhetagem eletrônica, como São Paulo. Se o sistema der certo, este tipo de cobrança deve ser oficializado nos ônibus e depois integrado com outros sistemas de transportes.
É um exemplo, guardadas as proporções de novo, de uma cidade que vai abrigar um evento esportivo e não vai precisar esbanjar dinheiro e mostra claramente o que é gasto para torcedor e gasto para passageiro diário.
É claro que as dimensões das cidades brasileiras são maiores assim como a demanda e ninguém está defendendo que se pinte faixas de ônibus nas cidades todas. Elas precisam de transportes públicos eficientes e economicamente responsáveis na relação custo-benefício, como corredores verdadeiros de ônibus e Metrô.
Mas seria interessante que as cidades deixassem de ser menos hipócritas e separassem o que é investimento para o torcedor ou para a demanda do dia a dia e priorizar os altos recursos para a maioria. Uma questão de respeito, lógica e democracia.
Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes.