RIO — Uma ampla reformulação no sistema de ônibus do Rio promete resolver o problema de sobreposição de linhas na Zona Sul e mudar a rotina de centenas de coletivos rodando vazios mesmo em horário de rush. A partir de julho, a prefeitura do Rio vai diminuir em 35% o número de ônibus circulando pela região, caindo dos atuais 2.000 para 1.300 — os 700 ônibus sairão definitivamente de circulação. O projeto é ousado: inclui a eliminação de 78 linhas (ou 63% do total) e o encurtamento do trajeto de outras 24. Serão criados 29 trajetos e mantidos 21. De acordo com a Secretaria municipal de Transportes, as mudanças implicarão ganho de tempo das viagens. O raciocínio é simples: com menos linhas fazendo os mesmos trajetos, haverá menos ônibus disputando passageiros nos pontos, permitindo que o trânsito flua melhor.
A nova configuração dos ônibus municipais na Zona Sul — não estão previstas alterações na frota intermunicipal — vai ao encontro de estudos que apontam uma total desorganização do sistema atual. Conforme mostrou reportagem do GLOBO-Zona Sul, em outubro, 80 linhas municipais que circulam hoje entre Zona Sul e Centro costumam rodar com apenas 15% de sua capacidade fora dos horários de pico; e com aproximadamente 50% em horas de rush. Foi o que apontou estudo apresentado na Semana de Iniciação Científica da PUC-Rio.
LINHAS DA BARRA COM NOVOS ITINERÁRIOS
O novo modelo terá como base oito principais linhas que passarão por dois corredores principais: Leblon, Ipanema, Copacabana, Centro, via Aterro do Flamengo, e São Conrado, Gávea, Botafogo, Centro, via Praia do Flamengo. Sete linhas integradoras ficarão responsáveis por ligar bairros da Zona Sul ao Maracanã e à Rodoviária via Lagoa e túneis Rebouças e Santa Bárbara. Também está prevista a criação de uma linha circular dentro da Zona Sul para evitar o transbordo de passageiros, caso nãos precisem passar por esses corredores troncais. Essa linha circular atenderá aos bairros de Cosme Velho e Urca. Algumas regiões contarão com linhas alimentadoras, como Rocinha, Vidigal, Horto e Leme.
As linhas que saem da Barra da Tijuca com destino ao Centro, cortando a Zona Sul, terão itinerários mais enxutos: passam a fazer somente o trajeto Barra-Zona Sul. A prefeitura argumenta que a maioria dos passageiros que fazem esses trajetos não usa o ônibus do ponto inicial ao final. Integração e dinamismo são os principais objetivos das mudanças, afirma o subsecretário de Planejamento de Transportes, Alexandre Sansão:
— Existe hoje um excesso de oferta de ônibus na Zona Sul, com linhas superpostas e ocupação média baixa. Muitos ônibus andam vazios em diversos horários. O sistema é a herança de um modelo inicial desenvolvido sem planejamento, com a lógica de que cada linha pertencia a uma empresa. Nós já temos um contrato de concessão. As linhas da Zona Sul são operadas por um consórcio, e, portanto, não é mais necessário seguir essa lógica — diz.
Sansão acrescenta que será possível otimizar a qualidade do serviço oferecido aos passageiros.
— Será possível gastar menos com combustível, com horas de motoristas e cobradores, menos ônibus em operação e, com isso tudo, será possível INVESTIR na melhoria de qualidade como consequência dessas medidas — pondera.
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Na avaliação do engenheiro de gerenciamento de mobilidade Ronaldo Balassiano, professor da Coppe/UFRJ, as medidas são importantes para dar mais fluidez ao trânsito em tempos em que cariocas perdem minutos preciosos em congestionamentos. Ele argumenta, no entanto, que a comunicação das alterações com antecedência é bastante importante para evitar transtornos.
— Racionalizar as linhas da Zona Sul vai contribuir para a fluidez do tráfego nessa área, além de gerar menos emissão de carbono. Não vejo nenhum problema (na otimização), desde que a nova dinâmica continue atendendo à demanda. Se houver boa comunicação com os usuários, é sim uma medida bastante válida. É importante que a população entenda o que está acontecendo.
META É AMPLIAR AR-CONDICIONADO
A maior parte dos ônibus que deixarão de rodar na região, garante a prefeitura, será de veículos sem ar-condicionado. Com isso, haverá percentualmente mais coletivos climatizados rodando pela Zona Sul. A Secretaria municipal de Transportes, no entanto, ainda não fechou todo o planejamento. Por isso, disse não conseguir precisar quais serão os percentuais de coletivos refrigerados após as mudanças.
A climatização de toda a frota da cidade foi prevista em decreto municipal de 30 de janeiro de 2014. Entretanto, em novo decreto publicado no dia 2 de janeiro passado, a prefeitura deu um refresco à exigência de as empresas dotarem 100% da frota municipal com ar-condicionado até 2016. Ao aumentar o valor da tarifa de R$ 3 para R$ 3,40, o governo não deixou explícita a obrigatoriedade, causando polêmica. Passou a valer “50% das viagens climatizadas”.
A assessoria de imprensa da prefeitura informou ao GLOBO, em janeiro, que o número real de coletivos regulares, com a tarifa de R$ 3,40, que circulam com ar-condicionado na cidade é de 1.760 (de um total de 8.266), o correspondente a 20,6% da frota. O número é menor do que os 28% que vinham sendo divulgados anteriormente pelo Rio Ônibus, sindicato que representa as empresas. No cálculo do sindicato, vinham sendo incluídos veículos especiais, os chamados frescões.
MUDANÇAS INDICAM REAÇÃO A INSATISFAÇÕES
Especialista em mobilidade urbana e professor do Departamento de Engenharia Industrial da PUC, o português Hugo Repolho foi o orientador do estudo acadêmico da estudante de Engenharia de Produção Marina Waetge, que mostrou o tamanho da insustentabilidade das linhas de ônibus que circulam pela Zona Sul do Rio. O levantamento apontou que os coletivos circulam na região com 50% da capacidade em horário de rush.
— O trabalho mostra que, ao contrário de outras regiões da cidade, há um excesso de oferta de ônibus na Zona Sul. As novas medidas parecem interessantes. Resta saber como serão feitos os cortes nas linhas. Isso requer um estudo aprofundado — adverte.
Hugo acredita que o anúncio das mudanças é uma resposta do poder público à crescente onda de insatisfação com os serviços prestados, que culminou nas passeatas de julho de 2013.
— Os sistemas de ônibus do Rio melhoraram um pouco com a instalação dos BRTs. Essa remodelagem na Zona Sul é mais um indicativo de resposta do poder público às insatisfações. Em qualquer cidade da Europa e dos Estados Unidos, a otimização das linhas é um conceito aplicado há muito tempo. Aqui, ainda falta muito. As empresas se juntaram e criaram consórcios, mas, na práticas, essas empresas operam com se fossem isoladas. Concorrem entre elas. Isso tem consequência negativa na qualidade dos serviço.
O engenheiro observa que as otimizações dos sistemas abrem espaço para questionamentos do valor da tarifa:
— Sem a redução dos custos operacionais (com a sobreposição de linhas), cada pessoa acaba pagando por duas. Se você tem uma melhor ocupação, o custo fica mais baixo. Isso, é claro, no plano teórico. Mas temos outras circunstâncias envolvidas no preço final da tarifa.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio/prefeitura-vai-tirar-de-circulacao-35-dos-onibus-que-passam-pela-zona-sul-da-cidade-15530842#ixzz3TiQ5R5ka
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